Aprovação Legal: é possível um projeto sair ileso (ou quase)?
Incorporar empreendimentos imobiliários no Brasil é quase um ato de bravura, dadas as incertezas que rondam todo o ciclo do negócio, como: economia instável; regras e convenções financeiras oscilantes; burocracia extrema e indefinição de prazos; mão de obra desqualificada; pouca industrialização da construção; carga tributária pesada; inexistência de lei específica que regule os contratos de aquisição de imóveis na planta; dentre tantas outras dificuldades. Entretanto, não existe fase de maior tensão que a de aprovação do projeto nos órgãos públicos. E os profissionais que atuam direta ou indiretamente com a legalização de projetos entenderão bem as situações que irei descrever nos parágrafos abaixo.
Via de regra,
as leis brasileiras foram (e são) escritas, propositalmente, de forma a dar
margens às interpretações. Isto é, nada é claro o suficiente que não possa ter
seu entendimento sujeito aos interesses de quem está com o poder da “caneta” nas
mãos. Não vou, aqui, ater-me a discorrer sobre os interesses aos quais esta
prática comum dos nossos legisladores servem, uma vez que o objetivo deste
artigo é falar sobre como atuar de forma legal diante destes recorrentes
entraves na hora de se obter o deferimento para a execução de empreendimento
imobiliário.
Que
profissional nunca foi surpreendido por um “Não
é permitido pela lei” em algum momento de seu trâmite de aprovação, em
alguma Prefeitura, de alguma cidade qualquer, após estudar junto com o arquiteto,
minuciosamente, todo o calhamaço de leis e normas para seguir rigorosamente a
legislação em seu projeto? Aí, ao questionar onde está escrito que não se
é permitido, foi surpreendido com um “Veja
bem, aqui diz que você pode fazer assim, mas neste outro parágrafo diz que se
for em tal situação é necessário fazer deste outro jeito, etc, etc, etc”...
E pronto, começou a ladainha para dificultar todo o curso de aprovação, que já
é demasiadamente burocrático.
Mas, o que
fazer quando se tem este tipo de surpresa?
Minha
resposta é: depende. Tudo depende de “n” variáveis, mas vou tentar elencar
algumas possibilidades:
- A-) É raro, mas o impedimento pode acarretar em uma interferência mínima no conceito do projeto e não ter desdobramentos que prejudiquem a qualidade do produto final e nem onerem a construção. Quando é este o caso, minha sugestão é acatar rapidamente à solicitação do órgão e ajustar tudo, entregando as plantas alteradas no menor prazo possível para que não dê tempo de os técnicos aprovadores esquecerem tudo que já analisaram e possam dar continuidade ao processo sem perder a celeridade ou correr o risco de encontrarem novo problema ao revisitarem as plantas. Assim, o impacto sobre o cronograma pré-definido será pequeno ou inexistente.
- B-) Se a proibição influenciar o conceito do projeto ou do produto, alterar drasticamente o partido arquitetônico, ou inviabilizar técnica ou financeiramente o empreendimento, antes de acata-la integralmente, sugiro reler o conjunto completo de leis com muita atenção e olhar crítico para entender se, de fato, não há saída para a interpretação dada pelo corpo técnico de aprovação. Minha experiência de dez anos de mercado e muitos projetos aprovados diz que, quase sempre, há alternativa, sim. No entanto, para obter êxito na argumentação com os técnicos, há que se ter total domínio e estar em conformidade com todas as outras leis estaduais, federais e NBRs existentes, para embasar bem qualquer pleito.
Outra
orientação é, primeiramente, conversar com o técnico responsável pela análise
e, somente se não houver abertura para a reversão do parecer com ele, solicitar
uma reunião com o superior (gerente ou diretor de aprovação). Desta forma, evita-se
o desgaste caso a questão se resolva ainda na primeira esfera.
Invariavelmente,
o que é importante frisar, é que não se deve aceitar uma negativa que terá
impactos consideráveis no produto sem avaliar se a lei é clara ou não, pois,
sendo uma questão de interpretação, é possível conseguir amparo legal em outras
legislações ou normas. Por exemplo, todos os projetos imobiliários devem
obedecer a NBR 15.575 – Norma de Desempenho, que possui uma série de
limitadores referentes a conforto térmico, acústico, iluminação, acessibilidade,
tráfego, etc. Comprovar que se está atendendo a tais parâmetros, através de
laudos técnicos se for necessário, pode resolver o impasse.
Mas,
como agir caso não seja possível seguir com o projeto original e as mudanças necessárias
comprometerem o produto?
O
mercado imobiliário mudou depois da recessão econômica pela qual o país passou
nos últimos anos e, se existe lado bom nisso tudo, é que o consumidor de imóvel
amadureceu. Portanto, não mais haverá aquela euforia desenfreada que fez com
que qualquer produto, bom ou ruim, adequado ou não, obtivesse sucesso nas
vendas.
Isso
significa que, se as alterações necessárias para que o projeto seja aprovado acarretarem
em prejuízos comerciais ao produto (como uma alteração significativa na planta
que torne a fachada ruim; uma redução de vagas de garagem que não permita atender
satisfatoriamente ao público-alvo; entre outros), é melhor lançar um ou dois
meses depois que o previsto a colocar um produto “mais ou menos” no mercado, visto
que poderá sofrer rejeição na venda.
Atualmente, é mais importante lançar o produto certo, que lançar no momento
certo, uma vez que, com raras exceções, as vendas ocorrerão de forma constante.
Não há mais aquele “estouro” de vendas no chamado “Evento de Lançamento” que
justifique o risco de se colocar à venda um projeto que não está totalmente
ajustado às necessidades do cliente.
O
incorporador deve entender que os tempos mudaram e que entre optar por cumprir
integralmente um cronograma ou satisfazer completamente o cliente, hoje, mais
que nunca, a última opção é a única alternativa que o levará ao sucesso e o
trará bom resultado.



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