A Tendência dos Apartamentos Compactos



    Há alguns dias atrás, fui visitar o ponto de vendas e os decorados do empreendimento VN Humberto I, na Vila Mariana, bairro nobre de São Paulo, cujo apartamento tipo menor possui 16m², e também fui conhecer a Vitacon Store, onde ficam expostos outros decorados compactos e o protótipo de um apartamento de 14m², além de várias maquetes, dentre elas, a do breve lançamento da marca, o VN Nova Higienópolis, que terá unidades de 10m².
       Anteriormente, já havia conhecido alguns empreendimentos com unidades residenciais pequenas, os chamados studios, mas que iam até 28m². Entretanto, nada passava perto de metragens tão reduzidas e, por isso, estava muito curiosa para entender como seriam esses projetos.

Foto do Decorado de 25m² do VN Humberto I
        Após visita-los e estudar o assunto com mais profundidade, entendi, em primeiro lugar, que eles estão, sim, muito alinhados com a tendência comportamental e de consumo dos indivíduos, em especial das gerações Y e Z, que dão menos valor ao “ter” e mais ao “ser”. Isso significa, em termos práticos, que ter acesso a bens como carro e apartamento é o importante, e não mais ter o próprio carro ou apartamento. Isso se traduz na economia colaborativa e, mais especificamente no mercado imobiliário, na locação por temporada através de plataformas digitais, como o Airbnb, por exemplo.
       O conceito destes apartamentos compactos está perfeitamente ancorado nessa tendência. Todos os produtos têm espaços comuns generosos para serem compartilhados e utilizados pelos moradores. As lavanderias coletivas podem ser usadas sem custo adicional, e além disso, haverá serviço de concierge para atender às solicitações por carros e bicicletas compartilhadas e os apartamentos não têm vaga de garagem privativa. Também está previsto nas Convenções de Condomínio que será permitido o aluguel por temporada* das unidades.

Fotos do decorado de 21m² (16m² + varanda) do VN Humberto I
      O maior diferencial de todos estes produtos que mencionei é, sem dúvidas, a localização privilegiada na grande metrópole de São Paulo, que não se trata apenas de um apelo de marketing, como em muitos outros. O transporte público (metrô e ônibus) é eficiente, os serviços e equipamentos urbanos (públicos e privados) de saúde, escolas, creches, universidades, bares, restaurantes, parques, museus, estão próximos de verdade. E essa característica principal é que traz total sentido ao discurso do incorporador.
    Além disso, o cuidado com a concepção arquitetônica e com o conforto do morador é evidente quando se encontra pés-direitos e caixilhos generosos, aquecimento central de água para os apartamentos e área técnica compartilhada para receber condensadoras para a instalação de ar condicionado nas unidades. Sem contar que o cliente pode, ainda, optar por receber o apartamento mobiliado, exatamente, como os decorados, por um valor que não considerei ser tão alto.
         Isso tudo posto, vamos a algumas reflexões a fim de desmistificar o tema:

  • O preço do metro quadrado alto X ticket médio acessível: toda aquisição (ou contratação) tem duas formas de análise: a primeira é o custo ou preço em si; e a segunda é o quanto vale um produto ou um serviço. Preço e valor são coisas bem distintas. Quando a análise para a compra ou locação de um destes imóveis compactos for o preço, e este for calculado com base na área da unidade, pode-se concluir que talvez este seja um pouco alto se comparado a outros produtos e localizações da cidade. Entretanto, se a análise se ativer ao valor percebido, pode não ser bem assim, pois o quanto um produto vale passa por atributos e características tangíveis e intangíveis. Por exemplo: quando compramos um automóvel, a escolha depende de uma análise racional e subjetiva de valor e não, meramente, do preço, pois se o que me agrada são os modelos esportivos, não levarei em consideração um “SUV” com motor mais potente que tenha um preço menor. No caso do mercado imobiliário, deve-se aplicar o mesmo raciocínio de valor e não unicamente de preço. Muitos fatores implicam no preço final de um produto imobiliário e, dentre eles, o principal é a localização. Os terrenos em regiões centrais e estratégicas de São Paulo são caríssimos para o incorporador e, por questões obvias, este custo precisa ser repassado aos produtos, tendo influência sobre seu preço final. E o que tem mais valor para o cliente? Morar em um apartamento de 16m² na Vila Mariana, ou em 100m² em algum bairro mais distante? A resposta é: depende. O cliente é que sabe qual a sua necessidade, seu desejo e sua possibilidade financeira.
  • O enquadramento dos produtos ao Plano Diretor e a LPUOS de São Paulo: nesse sentido, pode-se dizer que o conceito defendido, não por acaso, está muito alinhado ao novo conjunto de Leis da cidade, o que é muito bom. Fico animada ao ver uma empresa se apropriando da nova legislação de forma inteligente, ao invés de se lamuriar e pressionar o poder público para muda-la e voltar ao status-quo de sempre, construindo apenas apartamentos grandes de “alto padrão”, com muitas vagas de garagem nestas regiões mais nobres da cidade. O Plano Diretor de São Paulo (e suas Leis Complementares) foi proposto com o intuito de reduzir o número de veículos a fim de melhorar o trânsito, incentivar o uso do transporte coletivo e trazer mais diversidade de público às regiões centrais, proporcionando que pessoas que antes não teriam condições financeiras para morar nestas áreas tenham acesso a ela agora e possam ter melhor qualidade de vida. A “fachada ativa”, outro elemento previsto em lei, que é a implantação de lojas e serviços no pavimento térreo de frente para a rua, é bem explorada nestes projetos, o que é extremamente positivo em termos urbanísticos.
  • Os apartamentos compactos atendem a demanda crescente dos novos arranjos familiares: antes de qualquer coisa, é necessário ponderar que o conceito de família não é mais o mesmo de antigamente e, hoje em dia, uma pessoa que vive sozinha é uma considerada uma família unipessoal. Atualmente, tem aumentado o número de pessoas que moram sós: sejam jovens ou idosos (pessoas acima de 60 anos, mas que têm plena condição de viver bem sozinho). Segundo o IBGE, de 2005 a 2015 houve um aumento de 40% no número de arranjos familiares unipessoais no país**. Claramente, apartamentos de 16 ou menos metros quadrados são destinados a esta nova família formada por uma única pessoa. Já os apartamentos de 20 a 35m² atendem, sim, a famílias formadas por até duas pessoas (casais, amigos, mãe e um filho(a), pai e um filho(a), etc). Também segundo dados divulgados pelo IBGE, no mesmo período de 2005 a 2015, aumentou em 32% o número de casais sem filhos, no Brasil. Estima-se que a redução do tamanho das famílias é uma tendência sem volta, por inúmeros fatores, e há a previsão de que, em 2025, o número médio de integrantes por família seja de, apenas, 2,59 pessoas**. Assim, não é intensão fazer com que famílias maiores habitem espaços tão reduzidos, mas sim atender ao público que se enquadra nessas configurações familiares, descritas acima, e desenvolver produtos alinhados com a tendência social atual.


Gráfico da proporção dos tipos de arranjo familiar na sociedade brasileira - evolução de 2005 a 2015. Fonte: Anuário do Mercado Imobiliário 2016 - SECOVI (informação colhida do IBGE)

Gráfico da proporção de famílias com filhos na sociedade brasileira - evolução de 2005 a 2015. Fonte: Anuário do Mercado Imobiliário 2016 - SECOVI (informação colhida do IBGE)


  • A ideia de inclusão gerada através dos apartamentos compactos é verdadeira: não raramente, percebo um certo (ou total) menosprezo sobre o papel do incorporador na construção das cidades, principalmente vindo do meio acadêmico. Usando como exemplo o artigo que fora publicado pela professora e urbanista Raquel Rolnik, a quem reservo grande respeito, observo que o desenvolvimento destes empreendimentos com apartamentos compactos não tem, de fato, relação alguma com o posicionamento utópico (como ela mesma define em sue texto) de Le Corbusier ou Walter Gropius, no início do século XX, que defendia a arquitetura e a concepção de unidades residenciais mínimas para propiciar a inclusão social do proletariado da época, marcada pela grande escassez provocada pelas Grandes Guerras. Entretanto, nem por isso o conceito atual é menos legítimo, uma vez que a sociedade de hoje em nada se assemelha com a vivida por estes grandes profissionais e provocadores do passado. Também há que se deixar claro que este formato de produto só faz sentido para as metrópoles e quando implantados em bairros centrais e regiões nobres providas de todo o tipo de serviços e infraestrutura. Em cidades menores, onde há espaço e o deslocamento não é tão penoso, não há que se pensar nisto, pelo menos por enquanto. Quanto ao tamanho das unidades, faço um paralelo de que não há muita diferença em uma única pessoa morar em 16, 14 ou 10m² a uma família na qual quatro (ou muitas vezes mais) pessoas coabitam em espaços de 40 a 50m², área média das habitações populares brasileiras, muitas desenvolvidas através do programa federal “Minha Casa, Minha Vida”. Há demanda por habitação em todas as camadas sociais e é facultado ao incorporador (assim como a qualquer empresário) escolher a qual público direcionar seus projetos. Tratando, especificamente, do discurso de inclusão que a Vitacon usa ao defender o conceito de seus produtos compactos, venho mostrar um outro lado, o que nem todos (aliás a maioria) que morarão nestes empreendimentos têm condições financeiras para comprar ou locar apartamentos maiores nas mesmas regiões centrais da cidade. Sim, é inegável que estes produtos são destinados a um público culturalmente mais refinado, mas há que se distinguir que, nem por isso, seu poder aquisitivo seja alto.



      Enfim, após todas essas reflexões, concluo que há empresas dispostas a inovar no mercado imobiliário, atuando em congruência com as tendências comportamentais da sociedade e aspirações do consumidor, e é normal que a inovação gere discussões, sempre foi assim e sempre será. Mencionei, abertamente, o nome da Vitacon pelo seu protagonismo em relação a este tema, mas sei que existem outras incorporadoras, não só em São Paulo, desenvolvendo produtos a partir deste conceito, que é uma tendência mundial da sociedade dos grandes centros urbanos.

         E, para encerrar, não posso deixar de falar que, independente do nicho de atuação, estar atento e alinhado aos anseios e necessidades do cliente, seja este de qualquer camada sócio-econômica-cultural, deve ser o grande foco do mercado imobiliário e, àquelas incorporadoras que já entenderam isso, deixo minhas congratulações.

* Legislação que normatiza as locações por temporada: Lei 8.245/1991 e Lei 12.744/2012
** Fonte da Informação: FGV - extraída do "Anuário do Mercado Imobiliário 2016 - SECOVI"

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